domingo, 22 de maio de 2011

Clarkson sobre o futuro

Subtileza é para livros. Você pode voltar e reler uma passagem para saborear todas as metáforas e insinuações. Mas ela não serve para um programa bombástico como o Top Gear, e é por isso que ninguém percebeu a importância de terminarmos a temporada de 2008 com James May testando o Honda Clarity movido a hidrogénio.

Você deve ter achado um pouco sério demais - deveria ter visto a explicação técnica de 45 minutos que James planeou – e deve ter imaginado por que deveríamos terminar um programa que apresentou saltos com trailers, a história dos acidentes nos campeonatos de Turismo, com aquele olhar seco e directo sobre o Clarity.

Simples. Estávamos tentando ser subtis. Estávamos a tentar mostrar que este é o carro mais importante desde que o carro foi inventado. Que, com um tiro só, a Honda matou dois grandes problemas da sociedade moderna, os politicamente-correctos e os incorrectos. Remete à questão sobre o que faremos quando o petróleo acabar e cala todos que nos fizeram acreditar que os carros estão derretendo as calotas polares. Resumindo (e tirando a subtileza), o Clarity significa que podemos dormir tranquilos.

Como ele apenas liberta água, não há motivos para não conectá-lo à sua casa e usar seu motor para mover todos os aparelhos electrónicos. Todos mesmo. Mesmo se você vive num palácio. Ele realmente é a solução para tudo.

Infelizmente, é muito difícil obter hidrogénio. Actualmente não há infra-estruturas para transportá-lo ou vendê-lo. E o Clarity, honestamente, é só Géneses. Precisamos passar pelo Êxodo, Deuteronómio, Números e todo o Antigo Testamento antes que você possa comprar e rodar com o Clarity com funcionalidade e preço razoável.

Normalemente todos esses problemas podem ser solucionados com dinheiro. Mas isso é uma coisa que a indústria de carros não tem agora. Também não terá em um futuro próximo. Outras indústrias? É difícil pensar em uma. As petrolíferas estão confusas com o barril do seu ouro líquido vendido a somente $50. E se alguém pensar em invenstir nisso, descobrirá que os bancos não estão a emprestar dinheiro. Resumindo, e sem subtileza, dinheiro é uma coisa que o mundo não tem.

Também parece que as fábricas de carros vão optar pelo modo mais barato e mais fácil de fazer híbridos estúpidos, como o Prius, que todos os críticos podem dizer que não passa de um jeito complicado de fazer as pessoas sentirem que estão a fazer um esforço para salvar o planeta. Como leitores de um site de automoveis, sabemos que eles não estão fazendo isso. Híbridos consomem muita energia durante a sua produção e são ecologicamente devastadores quando tirados de circulação. E fazem, no máximo, 16km/l.

Fazer um híbrido para evitar o desastre é como substituir um vidro partido por um plástico. Ele deixa o ambiente aconchegante e aquecido novamente, mas ainda poderá ser assaltado. Precisa de um substituto para o espaço vazio? Precisa de hidrogénio? É caro e você não tem dinheiro. Também não vai ter até que as pessoas voltem a comprar os seus produtos. Eles não compram porque não têm dinheiro também. E se tivessem, não gastariam, porque o Daily Mail vai dizer que eles são presunçosos, extravagantes e vão causar cancro da mama.
Eu temo que (pelo andar da carruagem) não haverá nenhum grande avanço. Não haverá revolução. Os híbridos continuarão a ser comprados por tolos desinformados, o Clarity continuará driblando na Califórnia e o carro como conhecemos seguirá sem mudanças.
Entretanto, acho que eles se tornarão mais entediantes. Nos últimos anos recebemos quase toda semana, uma ligação de um homem a dizer que fez um carro V48 de £8 milhões e que o Stig gostaria de dar uma volta na nossa pista.

Vimos a Aston Martin etiquetando seus carros com a técnica “pense num número, agora duplique”. Tivemos a Lamborghini e a Porsche a trabalhar em supercarros fantasticamente caros de quatro portas. A Mercedes fazer um SL que custa £250 mil e a BMW imaginando que o que mundo precisa mesmo é da magnificência estúpida do X6. O mundo todo colou o nariz nos vidros e as empresas ficaram muito felizes em nos alimentar com caviar. Foi divertido, honestamente, mas agora acabou.

Isso não precisa ser necessariamente uma coisa má. Estive a andando por Londres num outro dia e, estranhamente, todas as concessionárias da Park Lane pareciam fora de moda, meio gordas, meio “última-semana”. Enquanto isso a loja vermelha e branca da Fiat na praça Berkeley parecia perfeitamente normal. Eu queria quase tudo dela. E quando chegaram com o 500 Abarth (que ouvi dizer que terá 200hp em um futuro próximo) eu fiquei muito inclinado a entrar e comprar alguma coisa.

Esse será o segredo dos fabricantes. Eles terão que pegar nos seus Panda “café-com-leite” e torná-los muito mais atraentes com uma pincelada aqui e um traço ali.

Vou contar um pequeno segredo: no mundo real, bem longe do enorme espaço da pista de testes do Top Gear, dirigir o Fiat 500 é muito mais divertido do que o Zonda. O Zonda correria mais, só que numa estrada secundária ondulada você sorriria muito mais num Fiat. Juro. Ou num MINI. Ou num pequeno Ford.

No futuro não distante, carros como estes tornar-se-ão regra para os entusiastas assim como nos anos 80, as pessoas venderam seus Gordon-Keebles e Bentleys para comprar um Golf GTi. Em vez de ficar a sonhando com o dia em que você comprará um Gallardo ou Scuderia, você deveria diminuir suas aspirações para algo como o novo BMW Z4.
Isso parece-me tão claro hoje como o X6 ser um erro. Há um ano atrás (que parece mais distantes que o século XIX) o Z4 era uma porcaria. Culparam o desenho exótico pelas fracas vendas, o que deve ser verdade, mas eu percebo que o motivo principal é que ele não vendeu por que era muito barato. Os compradores entravam na loja para comprar um quatro e saiam com um seis. E por que não fazer isso?

O novo modelo é equilibrado como o antigo, mas menos exótico. É muito bonito. Também tem o tecto de metal e, claro, é um BMW, o que não é um problema hoje porque os exibidos estão a comprar o Audi TT.

Estranho, não? As mudanças do Z4 são bem-vindas mas um pouco superficiais. Você pode até considerá-las subtis. Realmente, permaneceu o mesmo e o mundo mudou. Nós costumávamos sonhar em sair com uma modelo famosa, mas agora, parece que crescemos e percebemos que é melhor sonhar em sair com a vizinha bonita.

Há dois anos atrás, disse que o Z4 era um pouco enfadonho. Agora... quero um.

Clarkson sobre o BMW 730d

Logicamente não é mais aceitável gozar as pessoas por serem negras, homossexuais, ruivas, deficientes ou irlandesas. Então vamos começar a manhã a gozar Gerald Ford, o pai de George Bush, Bill Clinton, Ross Perot, Al Gore, Obama Barrack e John McCain. Pessoas canhotas.

Actualmente, esta terrível condição afecta cerca de 11% da população mundial e, em certos campos, o número é suficientemente alto para levantar as sobrancelhas. Além da política americana há o ténis, que é dominado pelos canhotos. McEnroe, Connors, Rusedski, Ivanisevic e aquele símio espanhol cujo nome eu não me recordo. Todos eles seguram as raquetes com a mão errada.

E há mais: se você tiver um filho canhoto, há uma boa hipótese dele ir ao espaço. Um dos quatro astronautas da Apollo era canhoto. Mas as coisas não serão tão boas se ele quiser ser piloto de corridas. Todas as estrelas dos últimos anos foram normais, tirando Gerhard Berger. Ele também terá dificuldade em ser um escritor porque seus manuscritos ficarão todos borrados.

Podemos ver, com tudo isso, que os canhotos são diferentes de mim e de si.

Sendo directo, eles são o que a ciência chama de “esquisitos”.

A história é menos bondosa. A palavra sinistro é derivada da palavra latina sinister, que significa esquerda. Gauche é esquerda. Maladroit é esquerda. Derek Hatton é esquerda. Tudo o que você não quer ser é esquerda. A esquerda passou a significar mau, desajeitado, difícil ou inconveniente. E é fácil perceber a razão de isto ter acontecido.

É bem difícil ver um canhoto a operar uma câmara ou encontrar uma mulher canhota. Quase todos são homens. O que mais? Um canhoto consegue mais facilmente adaptar a visão sob a água que um destro. Só uma conclusão pode ser tirada disso: os olhos deles não são humanos. Indo mais além: os seus pelos púbicos crescem mais rápido que o de pessoas normais, e isso quer dizer que eles podem ser lobos, ou ursos.

Certamente pudemos deduzir que não somente as ligações nervosas dos braços deles estão trocadas. O corpo inteiro é uma confusão. Surpreende-me que eles não espirrem cada vez que tenham uma erecção. Devem ter uma grande tendência à gaguez.

Pessoas de outras minorias nunca tentam dizer que são melhores do que a maioria. Você nunca vê ruivos a andarem por aí a dizer que assim como Simon Heffer e Nicholas Witchell, gente com cabelo laranja é mais inteligente que a média. Também não vê homossexuais apontando Oscar Wilde com um olhar presunçoso. Eles só querem ser iguais a toda a gente.

Mas o pessoal que precisa de virar as mãos para assinar um cheque gasta um tempão a fazer clubes destinados a provar que o facto de Leonardo da Vinci ter sido canhoto faz deles seres superiores.

Neste ponto eles são meio como os maçons ou a Mensa International, essas organizações estranhas para pessoas que pensam que são especiais porque conseguem colocar umas peças no lugar certo enquanto jogam xadrez.

Pense bem, os canhotos são piores. Eles pressionam os fabricantes de utensílios domésticos a considerar as suas dificuldades quando projectam computadores, panelas e electrodomésticos. Eles reclamam até mesmo de pias, e desculpem-me, mas não consigo entender como algo perfeitamente simétrico pode ser favorável a destros. Talvez eles estejam a reclamar que o ralo não é grande o bastante para escoar seus pelos púbicos.

Francamente, eu digo a eles que nós, destros, também temos os nossos problemas. O sextante, por exemplo, é muito difícil de ser operado e o... o... tenho certeza de que existem outras coisas também.

O que mais me irrita sobre os canhotos é que esses peixes-lobo têm um trunfo. Não me lembro de ter conhecido um canhoto chato. Por alguma razão eles tendem a ser interessantes, diferentes. Sniffpetrol.co.uk, por exemplo, é escrito por canhotos. Angelina Jolie é canhota. E não tenho a certeza, mas aposto que Stephen Fry é sinistro. Uma palavra que só ele entenderia.
E por sorte isso me traz ao BMW 730 diesel.

Veja só: executivos normais, que não têm dificuldades ao usar tesouras, compraram sempre um Classe S da Mercedes quando queriam uma excelente sala de estar móvel. A principal razão para comprar outra coisa é ser o chefe de uma grande companhia britânica, como a Jaguar. Nesse caso tem de ter um Jaguar.

Claro que se você for o Bonio dos U2, vai achar a Mercedes muito careta e então comprará um Maserati. Se você é Sir Alan Sugar, comprará um Rolls-Royce Phantom porque um Mercedes é muito barato. Se for um jogador do Manchester United, terá um Bentley porque é um tremendo exibido. Se você for normal, comprará um Range Rover e se for louco, um Maybach.

Resumindo: antes de comprar este BMW horroroso, tem que dizer “Não sou um executivo, normal, Bonio, Alan Sugar e nem Wayne Rooney”. Tem ser bem esquisito pra não ser nenhum deles. Precisa ter estranhos olhos submarinos e o escroto mais peludo do mundo. Para optar pelo “canhoto” dos carros você precisa estar todo trocado.

Porém, agora há um novo BMW série 7. Você não percebe isso só de olhar para ele ou estudando o motor, que é essencialmente o mesmo de antes. Mas este é um novo carro.

Apresentações? Bem, o modelo mais barato – o 730 diesel – começa em £53.730 e por isso você tem um carro que produz somente 192 gramas de CO² por quilómetro, que é menos que alguns Ford Mondeos ou uma vaca. Mais importante: chega a 16km/l em rodovias cuidando do acelerador. E se você não cuidar, chega a 100 km/h em 7s e vai até 245km/h.

Isso é adorável. Imagine, estou surpreendido que não o tenham feito 5km/h mais rápido. Aí eles poderiam dizer que é tão rápido que precisou ser limitado. Mas aqui estamos nós. Transparência é tudo hoje em dia.

Mais acima na tabela há a habitual gama de motores, incluindo um V8 biturbo e a conhecida gama de opcionais que os nerds compram. Você pode ter, por exemplo, um display que o mantém atento ao limite de velocidade, ou ter uma câmara com sensores térmicos que indica pedestres em sombras, ou pode ter câmaras laterais que indicam o movimento nos pontos cegos. Tudo muito bom também.

Infelizmente o série 7 decepciona por dois motivos. O primeiro é que BMW’s fazem muito barulho, é justamente aquele desportivismo de todos os seus carros. Mas desportivismo não combina com um carro como este. É como comprar um casaco quando você quer uma toalha de mesa. Sim, ele tem uma óptima direcção, óptimas reacções e anda bem, mas tudo isso tem um preço. E esse preço é o conforto e o silêncio. Simplificando, um Mercedes é uma condução mais relaxante e, num carro grande, largo, pesado e completamente não-desportivo, é tudo o que se quer.

Aí tem o sistema iDrive. Essencialmente é um botão – pense num rato de computador – que controla milhares de parâmetros no carro e tenho certeza que você se pode acostumar a ele da mesma forma que pode se acostumar a uma dor de cabeça.

Essa é a questão: na Alemanha você opera o botão com a mão direita. Tudo bem. Mas aqui é ao contrário e qualquer pessoa normal que já tentou usar o rato com a mão esquerda sabe que isso é simplesmente impossível.

Resumindo: o série 7 com volante na direita serve somente para quem usa a mão esquerda.

Clarkson sobre o Volvo XC60

No passado os carros eram extremamente seguros... desde que não se batesse em nada. Infelizmente, o meu pai costumava bater em absolutamente tudo, o que significa que ele saía para o trabalho de manhã e voltava para casa engessado. Ao longo dos anos ele teve tantos ossos removidos que, na verdade, tornou-se um manjar branco humano e nós aceitamos isso normalmente.

Por milhões de anos a velocidade máxima que um humano conseguiu atingir foi 65km/h e, mesmo assim, somente se tivesse um bom cavalo. De repente estávamos a viajar a 100km/h e achamos que as vantagens disso – poder ir visitar a sua sogra sem precisar passar a noite em casa dela – eram muito mais relevantes que a possibilidade de bater em algo a uma velocidade de quase dois quilómetros por minuto.

A ideia de que um carro poderia ser seguro era ridícula. Claro que não eram seguros. Eram úteis e glamorosos e muitas outras coisas além disso, mas nenhum de nós tinha dúvida: se batesse numa árvore, ou numa moita, ou mesmo num saquinho de baconzitos, a sua cabeça seria arrancada.

E há mais: você iria bater a perna direita na ignição e dar cabo do seu joelho, o motor soltava-se, invadia o habitáculo e abriria a sua barriga. A coluna de direcção de madeira partiria e um pedaço dela furaria seu baço. Os bombeiros não conseguiriam retirar-lo das ferragens porque o carro estava completamente amassado. E provavelmente em chamas também.

Então apareceu a Volvo, com uma mensagem simples. Você pode bater um desses carros sem se magoar. Meu pai ficou maravilhado com isso e imediatamente comprou um enorme 265, que tinha um pára-choques do tamanho do lábio inferior do Bubba, o amigo do Forrest Gump.

Ele adorou o carro porque assim ele podia bater em casas, caminhões de cerveja, postes, cachorros ou qualquer outra coisa que sua imaginação permitisse, seguro de que o único osso que que restava no seu corpo – o menor de todos na sua orelha direita – sairia intacto de um acidente.

A Volvo foi a primeira a disponibilizar cintos de três pontos, apoios para a cabeça, travas de segurança para crianças, faróis para uso durante o dia e bancos anti-submersão. Ela também contratou uma equipa de pesquisadores para visitar cada acidente de carro num raio de 160km da fábrica para recolher informações sobre o que feriu os ocupantes e o que pode ser feito para não acontecer novamente.

Durante muitos anos os suecos tinham esse nicho do mercado somente para eles. Se quisesse um carro valorizado, comprava um VW. Se quisesse um carro de qualidade, um Mercedes. Se quisesse um desportivo, um BMW. E se quisesse um carro seguro, um Volvo.

Mas aí todos os outros fabricantes compraram a ideia de segurança e agora, mesmo um pequeno Renault tem cinco estrelas na qualificação do pessoal da EuroNCAP. Como resultado disso, a Volvo está a usar a electrónica para se manter na à frente desse jogo. E é por isso que o pára-brisa do novo XC60 parece o sistema de monitorização de um míssil Hellfire. Nos outros carros, a electrónica serve para oferecer mais qualidade de áudio, um sistema de navegação mais preciso e porta-luvas refrigerados. No XC60 os computadores são usados para assegurar que você não vai bater.

O sistema chama-se City Safety. É equipamento de série em todos os XC60 e funciona mais ou menos assim: um radar “vê” a faixa de rodagem e se se aperceber que há algo errado ele trava o carro. É claro que eu precisava testar isso e também devo pedir mil desculpas ao condutor do série 3 por ter batido na sua traseira enquanto ele esperava em uma rotatória no anel viário de Oxford. Não sei o que correu mal. Mas certamente é preciso ler o manual de instruções antes de sair à rua e dizer aos amigos “vejam só. Eu não vou travar mas nós não vamos bater no carro da frente.” Porque, como eu comprovei, vai bater, sim.

Sei que o sistema só deveria funcionar no tráfego urbano em velocidades inferiores a 35km/h, mas pelo que notei, parece não funcionar de maneira nenhuma. Imagine só, eu sou um homem que diz sempre que o que compro não funciona. A Associação das Seguradoras Britânicas pensa de forma diferente, já que estão a considerar um desconto de 25% pela eficácia do sistema.

O City Safety é só o começo. O XC60 que eu conduzi também tinha luzes nos retrovisores que piscam na cor laranja quando um carro está no seu ponto cego, bem como um sistema que alerta o motorista se ele sair da sua faixa de rodagem numa estrada.

A Citroen, que foi a precursora desse sistema, avisa o motorista através de vibrações no banco, mas a Volvo obviamente imaginou que as mulheres iriam conduzir para fora da faixa deliberadamente só pra conseguir esse efeito e por isso este sistema alerta o motorista com um aviso sonoro muito irritante. Por isso eu desliguei-o.

Parece que eu tenho uma birra com os sistemas deste carro. De certa forma tenho. Eu entendo a segurança mecânica, zonas de deformação, células de absorção de energia e pára-brisas laminados. Mas eu não confio na electrónica. Pense em quantas vezes o seu laptop se estraga e vai entender o que eu estou a dizendo.

Dito isso, a Volvo merece parabéns por continuar a avançar na questão da segurança e também pelo XC60 como um todo porque este é o primeiro softroader* que conduzi que não se porta como um.

Agora, se não gosta de softroaders de cinco lugares – eu também não gosto – então você vai pensar que a Volvo na verdade resolveu um problema que ainda não existia. Quer dizer, por que você precisa de um carro alto com tracção integral só para levar as crianças para a escola? É loucura. Mas, ao menos, o XC60 roda como um carro normal, a condução é a de um carro normal e se você pegar a versão T6 a gasolina, o desempenho será de um carro normal também. Claro, você pode simplesmente comprar um carro...

Mas se quiser mesmo um 4X4 alto, este Volvo é melhor que o Nissan X-Trail e melhor ainda que o Ford Kuga. O interior é sofisticado como a Bang & Olufsen, os botões podem ser usados mesmo se estiver a usar luvas e tudo é intuitivo, menos o sistema de navegação da Volvo, que só o leva a lugares onde já esteve há três anos atrás.

O melhor deste carro é o que ele fá-lo sentir é da classe-média. Classe-média mesmo. Entrar neste carro é como usar umas cuecas do Johnny Boden enquanto torce pela sua filha numa pirueta. Esse é um carro para mulheres extremamente bonitas, que o vão usar para ir à academia de manhã, levar as crianças para a escola à tarde e sair para namorar à noite. Eu já consigo ouvi-las: “Gostavas de dar uma volta no meu Vulva XC60?”

O sistema anti-colisão deve dever-se a isso. Daí a Arabella não precisa explicar ao seu marido por que a frente do carro está amassada nem o que ela fazia no outro lado da cidade com o seu professor de ténis às três da tarde. Não é somente um carro muito bom, ele consegue salvar uns casamentos também.

*Softroader - termo inglês para designar SUVs e off-roads que não "servem" para off-roads, como o Kia Sportage e Hyundai Tucson, o Honda CRV e o recente Kia Soul
 

Clarkson sobre o Fiat Qubo


"Tentar ultrapassar o limite de velocidade neste carro é como tentar ultrapassar o limite de velocidade numa vaca."

Agora que nenhuma marca de absorventes íntimos pode exibir os seus produtos nos intervalos comerciais, o governo e vários outros órgãos empenharam-se em preencher o vazio com uma nova gama de filmes de utilidade pública.

Como chegam aos temas abordados eu não faço ideia, mas nos últimos meses ensinaram-nos a não espirrar em elevadores, a ter mais cuidado com motociclistas e, estranhamente, como descobrir que uma pessoa está a ter um acidente vascular cerebral (AVC). Por que um AVC? Por que não falar da gripe aviária, ataque cardíaco ou sífilis? E por que eu não posso espirrar num elevador? Se é lá que eu estou quando me der a vontade, o que devo fazer? Manter a boca fechada e apertar o nariz? Isso faria explodir os meus olhos!

Ah, e se os motociclistas querem que as pessoas os vejam nos cruzamentos, aqui vai uma sugestão: comprem um carro.

Evidentemente não há nada de novo nesta intimidação. Na minha juventude, lembro-me de ouvir Harold Wilson a dizer para não colocar tapetes sobre um piso encerado e Rolf Harris a recomendar que eu aprendesse a nadar. Mas a quantidade de ordens hoje é incrível.

Estão constantemente a dizer-nos para não fumar, não comer muito sal, não beber e conduzir, não esquecer a declaração do imposto de renda, não brincar com fogo de artifício, não andar em terceira e não passar o dia a ver TV.

E então nesta manhã, enquanto lia o manual do Fiat Qubo, descobri que por trás das câmaras as coisas são bem piores.

É como qualquer outro manual de carro. Escrito para tribos na Amazônia e marcianos, há um aviso sobre como ligar o motor e o que o velocímetro faz, mas enterrado no manual no meio de uma passagem fascinante sobre como utilizar os bancos, achei um quadro que diz que o carro é equipado com o sistema "Diagnóstico de Bordo Europeu".

Parece inofensivo: uma luzinha acende para avisar quando um componente relacionado com as emissões está avariado. Mas aí ele diz, casualmente, que os registos do funcionamento do motor são gravados e podem "ser consultados pela guarda de trânsito".

Posso estar a preocupar-me a toa, mas isso significa que o guardinha agora pode engatar um laptop no sistema de gestão do motor e ver a que velocidade você conduzia?

Se ele puder, a boa notícia é que se você comprar um Fiat Qubo, a polícia pode procurar quanto quiser, porque tudo o que vai descobrir é que, desde que comprou o carro, você nunca ultrapassou o limite de velocidade. Até porque isso seria como tentar violar o limite de velocidade em uma vaca.

O Qubo é uma carrinha. Ah, eles tentaram animar o carro colocando uma fantasia verde e janelas triangulares e certamente tinham uma sala cheia de caras com camisas de gola rolê a imaginar um nome para o carro. Mas ainda é uma carrinha.

Não tenho nada contra isso. O Citroen Berlingo é uma carrinha e sai-se muito bem como carro familiar.

O Qubo, não. Ele foi desenhado em parceria com a Citroen, é feito sobre a plataforma do Punto e é movido por um motor de 1,3 litros da Opel, se você escolher a opção diesel.

Nem precisava dizer que há todos os tipos de erros tolos. Por exemplo, a tampa do porta-bagagens é aberta por um botão na chave. Óptimo. Excepto pelo facto de que você vai apertar esse botão por engano toda vez que girar a chave para ligar o carro. Garanto. E então vai ter que sair do carro e fechá-la de novo.

Claro que poder abrir o porta-malas por um botão é bem útil se você está vindo das compras cheios de bolsas e sacolas. Mas você não vai conseguir abrir a tampa do porta-malas porque a traseira é tão grande que mesmo que tivessem estacionado a um quilómetro de distância, ainda não seria possível abri-lo. São esses os detalhes que transformaram uma boa ideia em algo que simplesmente não funciona.

Quando se trata de engenharia, nada pode ser "brilhante, apesar do...". Seja uma usina nuclear, uma parede de protecção ou um carro. O que quero dizer é: o Titanic era brilhante, apesar do seu leme mal feito.

Claro que pode olhar o preço baixo do Fiat Qubo - é quase o mesmo de um McLanche Feliz - e o baixo custo de manutenção e dizer que não se importa com a traseira, ou com a alavanca de velocidades robusta como uma das orelhas do Pernalonga, ou com o facto dele não ter tapete nenhum - deixe-me repetir: "não tem tapete algum" - porque oferece muito mais espaço que um hatchback comum.

Bem, vamos ver esse espaço. O interior do Qubo de cinco lugares não é muito mais largo que um carro normal e, certamente, não é muito mais comprido. É simplesmente mais alto, o que é bem útil numa carrinha, mas a menos que você tenha 2,50m de altura ou um cabelo black power imenso, esse tecto alto não faz diferença alguma em um carro.

A Citroën resolveu isso no último Berlingo que dirigi enchendo esse espaço com uma série de porta-objetos. O Fiat Qubo que testei tinha ali somente um monte de ar inútil.

Também não é tão versátil. Sim, os bancos traseiros são rebatíveis e podem ser levantados todos juntos. Mas, não irá colocá-los no lugar de novo, a menos que goste de trilhar os dedos.

Depois vem a velocidade. Eu testei o modelo 1,3 diesel, que leva mais de 16s para ir de zero a 100. Você pode não se importar com isso por ser é um fraco. Mas devo ser claro: estou a falar de um desempenho que só pode ser medido em termos geológicos.

Juro por Deus que o Qubo é tão lento que se entrar num de manhã para ir em direcção ao sul o mais rápido possível, a erosão costeira vai engoli-lo na quarta à tarde.

O monte Evereste está actualmente a mover-se para noroeste cerca de 5cm por ano. É essa a velocidade a que anda o Qubo. E pode ter a certeza de uma coisa: na estrada esse ritmo não é somente anti-social. É perigoso.

Não vejo problema se você quiser reciclar tofu e tricotar umas cuecas de renda, porque nada disso afecta ninguém. Mas dirigir um Qubo afecta toda a gente. Ele bloqueia o sistema. Deveria ser chamado Imodium.

Ontem na A44, imaginei uma cauda enorme. Ia dizer que me sentia como a cabeça de um cometa, veloz e furioso mas a imagem estava errada. Na verdade sentia-me como um espermatozóide.

Uma pobre mulher num Citroen C2 ficou tão cheia do meu ritmo tectónico que tentou ultrapassar-me de uma forma suicida. Se eu não tivesse travado para deixá-la voltar ao lado certo da estrada, ela teria batido de frente contra outro carro.

Você pode dizer que o acidente seria por culpa dela. Mas e se a mãe tivesse ligado pra dizer que colocou muito sal na comida e estava tendo um acidente vascular cerebral? E se ela estivesse prestes a espirrar e precisasse chegar em casa o mais rápido possível?

A batida não teria sido por culpa dela. Teria sido por minha culpa por colocar as necessidades dos ursos polares à frente das necessidades de toda a gente.

Clarkson sobre o Mercedes-Benz CLK 63 Black Series


No automobilismo não é preciso dizer que certas coisas são exclusivas. Não é possível, por exemplo, ter um desportivo baixo que ande como um off-road; não é possível ter uma alta velocidade máxima e boa economia. E não é possível ter sua dignidade se também conduz um compacto coreano. E embora muitos digam o contrário, você também não pode ter um carro que ande bem em Nürburgring e na estrada. Não podia, pelo menos até agora…

Você deve estar a pensar que o carro das fotos é algum modelo da DTM em versão de rua, duro como um prego, focado como laser e impossivelmente desconfortável, como se estivesse a andar, digamos, pelo rosto do Keith Richards.

Não é. O que você está a ver aqui é o único carro que eu conheço que realmente alcança o impossível. Um caro que, felizmente, consegue levá-lo e mais bagagem do que pode imaginar, até Pequim. Mas que, suspeito, pode dar umas dentadas no traseiro de um Porsche Turbo numa sinuosa e deserta rodovia "A" galesa.

Ele vem da divisão de projectos especiais que a Mercedes chama AMG. E é rotulado simplesmente em grandes letras de manchetes como “Black”.

O primeiro Black foi um desastre. A Mercedes encaixou um tecto rígido de carbono junto com uma suspensão dura de carbono num SLK e foi indubitavelmente muito agradável de pilotá-lo nas pistas. Mas os engenheiros estavam tão nervosos sobre a forma que se portaria no mundo real que não me deixaram testar um. “Não é muito bom” disse um porta-voz da Mercedes. E pelo que eu descobri com meus colegas que o testaram – muitos deles agora são alimentados com comida triturada através de um tubo no nariz – ele estava certo.

O novo Black é diferente. O ponto de partida é um CLK AMG, que normalmente vem com 474 cavalos produzidos por um V8 de 6,2 litros. Entretanto, para o Black, um pequeno ajuste no escape e na parte electrónica levou-o além dos 500 cavalos. Esqueça a Porsche. Estamos a entrar no território da Ferrari.

No interior os bancos bonitinhos foram trocados por conchas que abraçam o corpo. Abraçam tanto, na verdade, que eu até desafio Jon Bon Jovi a sentar ao volante e por o cinto de segurança.

Outros detalhes? Bem, os motores dos bancos foram-se, junto com o GPS, o motor do ajuste da coluna de direcção, os bancos de trás e alguns airbags. Os painéis das portas são de fibra de carbono, e o resultado final de tudo isso é que o Black pesa apenas um bocadinho mais do que quando os engenheiros começaram.

Isso se deve principalmente porque ele tem um eixo traseiro bruneliano* e um diferencial de granito. Oh, e também o melhor kit aerodinâmico que eu já vi.

O resultado do conjunto é incrível. Inicialmente, quase nos mata de susto porque parece que está a dançar na estrada, e depois dá-se conta de que ele está a dançar. Você só está a conduzir a dança.
Eu adorei este carro. Adorei. Adorei o barulho da ignição, um rugido imenso que diz “olá!”. Adorei a velocidade. Adorei a aparência. E adorei a forma como ele grudou no chão e andou com uma elegância que surpreenderia os pilotos de teste da Ferrari quando eu subi a montanha galesa. Realmente pode-se falar deste carro com o mesmo fôlego que se fala do 430.

Mas aqui está a surpresa. Não é um Ferrari. É um Mercedes CLK. E sim, enquanto alguns dos acessórios foram sacrificados, ele ainda tem a caixa de velocidades automática, cruise control, ar-condicionado e aquela integridade alemã na estrada. Até é confortavel. E digo que é mais suave do que o meu SLK55.

Há mais? Por que os bancos traseiros se desapareceram – e a EU não permite que sejam colocados lá novamente caso a lua saia de órbita ou qualquer outro motivo sem sentido – há mais espaço na traseira que em muitos celeiros. Tem até um sistema que permite que se ligue o iPod e se veja no painel qual música que se está a ouvir.

Entende o que eu estou a dizer? É um carro normal. Mas anda como um foguete. E graças aos travões carbono-cerâmicos, ele também pára muito bem. Um Ferrari é incrível no lugar certo, mas enfia o nariz em qualquer lugar, o couro range e os faróis não são bons. O Black é brilhante, em qualquer sentido, em absolutamente tudo. Por milhas e milhas. É meu novo carro favorito.

Só tem um defeito. Mesmo vindo com um monte de coisas a menos que o normal CLK AMG, custa ridículas £34.000 a mais. Sim. Sim é isso. O Black é um carro de 90 contos e isso é demais.

Deveria custar £66.000 como a versão normal – e os compradores poderiam optar. Um carro sensível às suas mãos ou um que faça o serviço direitinho.

Ainda assim, eu tiro o chapéu a qualquer um que compre esta coisa. Um Ferrari ou um Porsche podem dizer mais de si a mais gente. Mas o que um Black diz, baixinho, é: “se realmente percebe de carros, sabe porque é que o homem que está ao volante o comprou...”