sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

May sobre o desenvolvimento de carros e o Evoque


Quando vê TopGear na televisão, depara‑se com um fluxo contínuo de imagens e panorâmicas de Richard Hammond, juntas como painéis de carroçaria soldados. Não consegue ver as junções. Claro que não é isso que acontece, visto que é um programa filmado em estúdio. Entre as partes que vê, carros são mudados, luzes são ligadas e quadros de voltas são levantados; a área das notícias tem de ser montada e os donos feios de carros da Subaru no fundo das imagens têm de ser trocados por mulheres bonitas. O cabelo do Hammond é reconstruído, o ego do Clarkson é esvaziado e quem desmaiou é apanhado e colocado na relva ao lado da nossa pista de testes. É um pouco como estar na guerra. Horas e horas de estar parado sem fazer nada, ao que se seguem alguns minutos de ação furiosa. A menos que esteja na assistência... Nesse caso, são horas e horas de estar parado sem fazer nada, ao que se segue uma caneca de chá e um pacote de batatas fritas com o prazo de validade há muito expirado. É natural que existam períodos em que nos limitamos a brincar com a simpática assistência das quartas à tarde. E por vezes até fazemos um inquérito improvisado. Segue‑se o resultado de um dos inquéritos mais interessantes.
Na semana passada, descobrimos que apenas duas pessoas na assistência tinham alguma vez participado num track day. Duas em 500. Descontando todas as esposas e namoradas entediadas presentes na assistência (que lá estão para satisfazer a implacável política de diversidade TopGear), é seguro assumir que é composta por entusiastas de carros. E só dois tinham ido a um track day. Na sociedade em geral, a proporção de participantes em track days é minúscula. Tudo isto está relacionado com o meu discurso sobre a irrelevância de Nürburgring no desenvolvimento de um carro novo que será conduzido no bairro londrino de Hammersmith.
Atenção: eu não acho que um carro deva curvar mal, estou apenas a dizer que é coisa de idiotas. Claro que um carro deve curvar bem, mas é algo para ser apreciado subliminarmente – uma força benéfica latente. Não deve ser explorado activamente, porque isso só leva a que se criem carros destinados a conduzir em pista ao invés de na estrada. É como configurar uns chinelos para fazer montanhismo. Claro que vão ser prejudicados no seu papel principal de chinelos. É óbvio que se uma marca usar Nürburgring e fixar um tempo de volta, toda a gente se sente obrigada a fazê‑lo. E antigamente eram só 911 mais leves e potentes, mas agora até andam berlinas na pista. É provável que carrinhos de bebé e de compras cheguem à pista em breve. Alguma coisa tem de ser feita. E já foi feita. Estranhamente, a salvação veio da Land Rover, com o Range Rover Evoque, que eu conduzi há umas semanas. É surpreendentemente bom fora de estrada e excelente no alcatrão. Devo, portanto, agradecer à Victoria Beckham.
Como nós gozámos quando soubemos que ela seria a consultora de design do Evoque! E que enganados que estávamos. Quero retirar essa chacota em nome do pessoal da TopGear. Afinal, a mulher é genial. Suponho que ela não se interesse muito por Nürburgring, e essa é a sua maior virtude enquanto designer automóvel. Uma pista cheia de pessoas em fatinhos coloridos não tem nada a ver com uma rapariga de bem, e nem comigo, que estou em contacto com o meu lado mais chique. Não tenha dúvidas que o Evoque tem uma condução maravilhosa por causa de Victoria. Ela apresentou‑se sem preconceitos de como um carro deve ser desenvolvido, livre da tirania do comportamento em curva. A julgar pelos seus sapatos, terá dito: “Bem, deve ser confortável”, e ela tinha toda a razão. Obrigado, minha senhora.
E neste exemplo está o modelo para melhorar muitas outras coisas na sociedade que são regidas por um pequeno grupo de fanáticos. Como os relatos de futebol: é um pouco imperscrutável para um espectador casual como eu. Vamos pôr também o Hammond ao microfone, para animar aquela algaraviada com as suas inspiradas observações sobre a vida em geral, impedindo que falem constantemente nas subidas e descidas de um jogador, como se fosse um metrónomo. Quando isto acontecer, e Michael Gambon der voz às comunicações das estações de comboios, veremos o Evoque de Victoria como o evento seminal e revolucionário que é. Senhora Beckham, é a minha segunda Spice Girl preferida.*
*A seguir a Madhur Jaffrey

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